Quem quer ser prefeito?

Aproximavam-se o período eleitoral e não dava outra, o tal do voto em branco seguia firme com mais de 70% das intenções de voto na pequena cidade de Torranópoles. Os especialistas estadistas já não convenciam mais, as lorotas de suas retóricas já incomodavam ao invés de causar esperança. O jogo havia mudado, até mesmo o analfabeto letrado havia aprendido a controlar as paixões da influencia e a substituído pela supremacia da lógica de que era preciso de fato haver uma mudança.

Era preciso um novo nome, um novo discurso para que a filosofia do antigo poema romano de Juvenal ainda fizesse sentido. Não havia ninguém em Torranópoles com tamanha façanha.

Certo dia, durante uma conversa no barzinho de seu zé do galo, vizinho a prefeitura, surge um senhor moreno, aparentava uns cinquentas e poucos anos, mas já com alguns cabelos grisalhos, não todos. Entre um gole e outro da aguardente, chamava a atenção com suas frases de efeitos e seu discurso truão. Todos que assistiam sua alocução prestavam atenção como antes se fazia no palavrório político. Seu jeito simples, voz serena e com o palavreado de entusiasmo era um candidato perfeito para vencer o então invencível voto em branco.

– Como se chamas? Perguntaram os políticos.

– Nelson, disse o senhor.

– Nelson, Nelson de que? insistiram os lobistas do poder.

– Apenas Nelson. Retrucou o senhor

Os habilidosos partidaristas que assistiam aquela cena e se emocionavam com o colóquio daquele senhor de origens desconhecidas, logo o levaram para a filiação e com mentiras e parolas, o convenceram de que ele seria o prefeito ideal. O senhor, sem nome de família importante, “vindo do povo para o povo” teria sua campanha vencedora.

E assim se deu, o homem que bebia no boteco da esquina, que cantarolava pela madrugada, que comia no chão ganha as eleições de Torranópoles com mais de 65% dos votos válidos, ainda hoje, não se sabe se as pessoas concordavam com os aconselhamentos do discurso de Nelson ou se foi apenas votos de protesto.

No primeiro dia, agora como autoridade maior do município, Nelson sentiu todo o poder em suas mãos. Chegou cedo na prefeitura e mau sentou no seu trono underground recebeu a visita de seus partidários, que já traziam nomes para ocupar o primeiro e o segundo escalão de sua gestão.

O novo prefeito, de posse de uma vassoura que se escondida atrás da porta, expulsou todos os politiqueiros dali e propôs que em seu governo, tudo seria diferente. Ao invés de assessores, a população deveria discutir seus problemas com as associações de bairro e as responsabilidades seriam divididas, todos teriam voz desde que apresentassem soluções.

O novo prefeito varria as ruas da cidade com os garis, estimulando as pessoas a não jogarem mais lixos no chão, fazia mutirões para concertar as praças e as escolas, aliás, os melhores salários eram os dos professores. Na saúde, estimulou os médicos a reciclar seus conhecimentos e até comprou novos equipamentos já que sobrava dinheiro pois não haviam empregos fantasmas, nem corrupção. Todos os indicadores subiram, e pela primeira vez, o torranopolense sentia orgulho de sua cidade.

Enraivecidos com os resultados do novo prefeito, os malévolos políticos trataram logo de buscar arruinar essa situação, mas Nelson não deixava brechas que permitissem haver contradição e malfeitos.

Foi então que eles tiveram mais uma ideia. Era preciso descobrir de onde surgiu aquela criatura tão pura, honesta e criativa.

Não deu noutra, com um pouco de esforço descobriu-se que o senhor Nelson era um fugitivo de um manicômio da cidade de Delirolandia, a setenta quilômetros dali. Bastou ligar para o hospício e logo os clínicos vieram busca-lo.

A população esqueceu os resultados e os valores implantados pelo prefeito e se reuniu na rua para vaia-lo e jogar frutas e ovos podres quando ele passava. Afinal, Nelson havia enganado a todos, pois não tinha faculdades mentais suficientes para assumir tamanha responsabilidade.

Torranopoles voltou a ser governada pelos falsários da velha política pão e circo, tornando os torranopolenses um povo sofrido e escravo de prazeres de corruptores.

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